Há dias que, inicialmente,
você até imagina que poderiam ser riscados da sua vida sem nenhum prejuízo.
Tardes, então, que, aparentemente são terrivelmente ruins, porém, podem ser
registradas como altamente positivas, dependendo do ângulo de visão. Ontem à
tarde, por exemplo, foi um desses dias. Por volta das 14h30, saíamos para Rio
Branco. Eu e minha irmã. Eu dirigia o carro. O bendito pneu traseiro do lado
direito, o primeiro a furar na minha última aventura de Rio Branco para Sena
Madureira, quando três deles furaram, furou de novo. Desta vez, na saída de um
supermercado, em Rio Branco, antes de pegarmos a estrada. De novo a roda ficou
presa, tivemos sérias dificuldades para tirar o pneu, repor o estepe e procurar
uma solução para o problema. De repente, surge um mecânico, que fazia um
serviço próximo, pergunta se está tudo certo e tenta ajudar. Nada. Solução:
encontrar um tubo de ferro para fazer um reforço na chave de roda. Saímos, eu e
o mecânico, em busca de algo para ser adaptado à chave de roda. Consigo ume “pedaço
de cadeira de ferro”, mas o furo é menor que a dimensão da chave. O mecânico
demora mais um pouco e aparece com um pedaço de ferro com espessura suficiente.
Antes que ele conclua, aparece um mototaxista, que era o que ele tinha ido
fazer ali naquele local: esperar um para poder ir embora. Concluo o serviço de
troca da roda por ele e vamos buscar uma solução. Primeiro ponto positivo do
dia, com todos os problemas: caso minha irmã estivesse só no carro, na estrada
de volta para Sena Madureira, precisaria de muita ajuda, pois, naquelas
condições, não teria como trocar o pneu (velho e buchudo) que tinha furado. Decidimos,
então, não voltar ontem para Sena e rodar, em Rio Branco, para solucionar definitivamente
o problema. Fizemos tomadas de preços, calculamos juros e terminamos, depois de
idas e vindas, voltando à segunda loja: a Pemaza, no Segundo Distrito. Escolhi
o modelo dos pneus. Lembrei-me que tinha me despedido de todo mundo no Facebook
(e no Twitter) e prometido voltar lá pelas 17h, já de Sena Madureira. Estava
com a bateria do celular zerada. Vi um ponto de energia elétrica próximo do
macaco e lembrei-me que minha mochila estava no carro. Peguei o carregador. Naquele
ponto, ainda usando o celular com o cabo de força ligado à energia da loja,
passei a avisar os amigos, pelo Facebook, do imprevisto. Minha irmã entrou,
acompanhada da vendedora, para passar o cartão de crédito e pagar os pneus.
Todos os que estavam no interior da loja estavam dominados por dois
assaltantes, que usavam capacetes e portavam uma pistola 7.65 e uma 380, todas
de uso exclusivo da polícia. Depois de quase 20 minutos, minha irmã retorna. Eu
ainda com o telefone à mão, levanto os olhos, ela me mostra as mãos trêmulas, e
fala algo desconexo:”momento de oração”. Não entendo nada. Depois completa: ”um
assalto, um assalto. Fomos todos assaltados dentro da loja.” A preocupação dela
era que os assaltantes, armados, saíssem da loja, fossem para a área que eu
estava, rendessem a gente e levassem o carro dela. Ponto positivo da tarde, até
aí: o Facebook terminou me “salvando” de ser assaltado. Descontraída, ela conta
que entrou na loja, e quando se aproximou do caixa para pagar os pneus, viu
todo mundo ajoelhado, como se estivessem virados para Meca, ou em oração. Como estava
próximo das 18h, pensou que os donos da loja eram evangélicos e tivessem algum
momento de oração antes de fecharem a loja. Lembra que um homem se dirigiu a
ela e disse: “Senhora, vá para aquele lado. Ela, não ciente que de estava sendo
assaltada, respondeu: “Eu não, eu não quero ir prali não!”. “Senhora, vá pra lá”
teria ele, dito, com voz mais alterada. Ela virou-se, olhou para o rapaz,
encarou o capacete e ele disse: “a senhora tá vacilando, tá me encarando muito”.
Puxou a arma da cintura, com ela em punho, segurou a minha irmã com os dois
braços para trás e disse: “a senhora vai ou não para lá?” Só ao ver a arma
minha irmã percebeu que se tratava de um assalto. Mas não perdeu a piada, algo
característico na família. Respondeu: ”Calma, moço, eu pensava que era só um
momento de oração”. Só agora, quando ela contava como foi o assalto, fiz a
ligação com o que ela havia dito anteriormente: “...momento de oração...” era
porque todo mundo tinha sido posto de joelhos. Depois de ter sido “convencida”,
narrou ela que ajoelhou-se por trás de um dos homens mais altos que estavam no
chão da loja. Nesse momento, percebeu que precisava escondeu o cartão que
estava no bolso: pôs embaixo do joelho direito. Quando os assaltantes gritaram “Dinheiro,
celulares”, ela teve a perspicácia de pôr o dela embaixo do teclado do
computador da loja. Um deles, em virtude da demora, parece ter se convencido
que a loja não tinha dinheiro além do arrecadado e disse: “tá demorando demais,
vamos, vamos”. E se foram sem ser importunados. Eu, com o Motorola Defy à mão,
ainda navegava pelo Facebook e não percebi nada dessa história violenta e cheia
de humor. Minha irmã, conta e reconta. Desde ontem damos boas gargalhadas. Ela
perdeu um cordão e um anel de ouro. Mas diz ter feito todas as piadas que pode.
Esse é o outro ângulo de uma história de violência, de um assalto: o humor com
que se pode olhá-lo.